Considerações sobre o tempo e sobre o vento...

Eu o Luís Bento prometemos um texto em parceria. Por enquanto ainda está no forno por conta de uma gripe que pegou o Luís e de um esgotamento físico que me afastou daqui e dos outros meus dois espaços.
Vão aqui postados nossos textos na Tertúlia Virtual de fevereiro. O tema do mês foi Tempo.

Tempo...


...de flor


A TV informa: terminou o horário de verãor

Há dias o verão foi partindo de mim. Foi levando sua falta de brisa, seu sol escaldante, as sensações ruins do excesso de calor.

Um vento vem invadindo minha alma, tornando mais lindas minhas manhãs.

Outro dia sonhei com uma noite enluarada. Devia ser uma noite de maio.

Adoro maio e seus dias perfumados. Dias em flor.

Acho que maio está começando a amanhecer em mim.





Ainda a mãe se encontrava prostrada na maca da ambulância berrando de dor de parto e já ela lhe esgadanhava as coxas metendo a cabeça de fora, ávida de ganhar o mundo. Nascida antes de tempo, com pressa de atingir a perfeição, tudo na sua vida fôra uma olimpíada sem obstáculos. Dispensara as primeiras letras porque as segundas, trouxera-as com o cordão umbilical. Clássicos, modernos e assim-assim; contas, números e rabiscos foram segredos breves e acelerados, desvendados de forma esparsa e apressada. Faculdade, emprego, administração, adormecer em Londres, almoçar em Paris, jantar em Madrid, reuniões, accionistas e congressos... Foram degraus esgalhados a quatro e quatro numa escalada vertiginosa rumo ao sucesso, num sprint a contra relógio sem tempo para olhar para trás.
- “Não casas mulher?... Não tens filhos?... Vamos ao teatro?... Cinema? Um cafezinho?”- A tudo respondia com uma leveza insustentável:
- “Não tenho tempo!”

Até que um dia, por volta dos quarenta, numa curva da vida sem travões, durante uma viagem de carro com destino aos negócios, numa ultrapassagem com erro de cálculo foragido às leis da física vira, de repente, aquela luz frontal… A mesma que a encadeava agora vinda do tecto e iluminando todas aquelas batas brancas. Sentia frio, muito frio. Uma dormência letal no seu corpo banhado a hemorragia por dentro… Ao longe e de forma esbatida, ouvia murmúrios e o fraco tremeluzir do gráfico… E aquela luz… Aquela luz que a ofuscava… Se ao menos conseguisse fechar os olhos…

Então, de repente, de segadeira em punho, surgindo do meio do nada, esquálida, gélida e envolta no seu manto lúgubre surgiu a morte com o indicador espetado indicando-lhe que a seguisse…
"Que não… Que não ia, tinha muita coisa para fazer… Holdings para vender, contratos para assinar, posições para assumir"…
- "Piiiiiiiiiiiiiiiiii"… - O alarme sonoro e os acenos de cabeça foram a pedra de toque para desligar a máquina e apagar, finalmente, aquela luz…

A morte apontou-lhe o dedo de novo insistindo para que a seguisse…
- Não! Não me leves ainda! Deixei tanta coisa por fazer… Dá-me tempo…
Meneando a cabeça para a esquerda e para a direita, num movimento lento e sentenciador, a morte inclinou-se e com uma leveza insustentável proferiu:
- Desculpa! Não tenho tempo…

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