Acabou o amor
O anúncio do resultado das urnas na noite de 7 de outubro, no Rio
de Janeiro, deveria simbolizar o fim de uma campanha vitoriosa liderada
pelo PMDB e apoiada pelo PT na capital fluminense. Eduardo Paes, com
64,6% dos votos, liquidou a disputa em um só turno, conquistando mais
quatro anos para o partido na cidade com uma votação histórica. De
braço dado com o vice-prefeito eleito, Adilson Pires, do PT, Paes não
disfarçou, em suas primeiras palavras após a eleição,
a próxima empreitada. O tom ainda era festivo, mas soou como trovoada
para a aliança que reelegeu Sérgio Cabral e Paes. “A gente tem uma
grande coligação de partidos, mas o meu PMDB tem um grande nome que é o
Pezão, e nós vamos buscar construir uma grande aliança para continuar recuperando o Rio de Janeiro”, disse Paes.
O prefeito antecipou – certamente não de forma inadvertida – o que
pode ser o fim do romance de sete anos entre petistas e peemedebistas
no estado. Pezão é candidato. Fala como candidato. E diz, ele próprio,
que o governador Sérgio Cabral pensa em abandonar o governo no fim de
2013 para dar visibilidade ao vice, estratégia idêntica à de Aécio
Neves com Antônio Anastasia em Minas Gerais. “Sou contra o Sérgio sair
no final de 2013. Acho besteira. Mas ele diz que seria importante que
as pessoas me conhecessem como governador”, afirmou Pezão, em
entrevista ao site de VEJA no Palácio Guanabara.
A massa dos eleitores da capital ainda não sabe, mas o senador
petista Lindbergh Farias também concorrerá. E, dessa vez, não pretende
abrir mão da disputa. Em 2010, Lindbergh queria tentar o governo. O
acordo feito entre PT e PMDB obrigou o ex-presidente da UNE a guardar o
plano na geladeira. Luiz Inácio Lula da Silva usou seus feitiços para
evitar que os dois partidos rachassem no Rio. Em troca, Cabral apoiaria
o petista para o Senado. Os caciques dos dois partidos têm dois anos
para resolver o seguinte: Lindbergh não concorda mais em ter o PT como
satélite dos peemedebistas; ao mesmo tempo, está traçado o plano de
Pezão, Cabral e Eduardo Paes para manter o PMDB no poder até 2018 –
pelo menos.
Lindbergh vem aproveitando palanques nas cidade estratégicas do Rio
para se mostrar como alternativa viável para 2014. A expectativa do
senador é de que, até lá, o PMDB se convença disso, propondo que a vaga
que ocupa no Senado fique com um peemedebista. E lança um argumento
forte – fortíssimo: “O cenário ideal para mim é ser o candidato de todo
mundo. Vou tentar mostrar que sou o mais forte para derrotar o
Garotinho”, afirma, lembrando que o ex-governador está vivo e atuante
no interior, sempre rondando o Palácio Guanabara. Os 'ensaios' do
senador já cogitam até uma parceria com o PSOL de Marcelo Freixo, que
alcançou 28% dos votos para a prefeitura do Rio. Por enquanto, é
brincadeira - mas certamente o PMDB não riu da piada.
Em campanha – Pezão e Lindbergh trabalharam em
2012 como quem faz campanha. O petista rodou 61 municípios onde o PT
tinha candidato próprio ou estava em alguma coligação. No interior,
“Lindinho” – para os eleitores mais cativos – serviu de cabo eleitoral
na TV para os candidatos a prefeito do PT. No Sul Fluminense, onde está
a força política de Pezão, Lindbergh foi exposto não só nos horários
fixos da tarde e da noite. O rosto do senador entrou nas inserções
durante o dia, quando ele também aproveitou para falar de seu mandato
em Brasília.
Pezão, a cada mês, independentemente de período eleitoral, roda
cerca de 15 cidades. A todo desastre no estado é o vice-governador uma
das primeiras autoridades a chegar, como foi o caso das chuvas na
Região Serrana em janeiro de 2011, quando Cabral estava na Europa. Em
tempos de campanha, Pezão visitou 32 cidades durante três dias da
última semana. Na segunda-feira, acompanhou a Cabral e Paes em Brasília
para agradecer o apoio de Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva.
Na quarta-feira, reuniu-se com o governador e com o prefeito,
novamente, para saber como será a campanha nas outras cidades que foram
para o segundo turno. No mesmo dia, recebeu seis prefeitos eleitos e
tinha mais outros cinco marcados. Eram tantos que nem lembrava mais as
cidades de onde vieram as visitas.
O vice-governador não gostaria de enfrentar o PT no lado oposto.
Para ele, Lindbergh não precisa sair do Senado. Pezão quer herdar e
manter a ampla aliança montada por Cabral, seu guia. A história do
atual vice-governador na política começou como vereador de Piraí,
cidade de 26 mil habitantes no Sul Fluminense. Em 1985, Cabral,
tentando se eleger deputado estadual, desembarcou no município. Jogou
futebol com Pezão, que era o goleiro do time. “Abria o pé e fechava o
gol”, brinca, falando de seu sapato 48.
Como em todo grande amor, a história tem coincidências curiosas. No
dia da pelada no Sul Fluminense, estava presente o pai do vice-prefeito
eleito do Rio, Adilson Pires. Foi ele quem registrou o encontro em
foto. Anos depois, Pezão estava em um SPA em Angra dos Reis e encontrou
Cabral, que tinha, até recentemente, uma casa no balneário. “No dia em
que eu for governador, esse cara será o meu vice e cuidará do
interior”, disse Cabral para Adriana Ancelmo, com quem ele iniciava um
relacionamento.
O casamento de Sérgio Cabral e Adriana Ancelmo sofreu abalos desde
então. Mas a relação com Pezão só se estreitou. Com Pezão cuidando do
interior, Cabral foi reeleito com 70% dos votos em 2010. O cartão de
visitas do primeiro mandato foram as UPPs, algo que ainda não existe
fora da capital. No novo mandato, a euforia da pacificação de favelas
baixou. Os problemas, como a corrupção da polícia, apareceram também
nas favelas ditas pacificadas. E fotos de Cabral em Paris com Fernando
Cavendish e secretários vieram à tona no auge do escândalo da Delta. Um
dos resultados foi a queda de desempenho do PMDB, que fez 22 prefeitos
em 2012, menos do que em 2008. No segundo maior colégio eleitoral do
Rio, o município de São Gonçalo, os peemedebistas estão fora do segundo
turno. Agora, apoiarão o candidato do PDT, Adolfo Konder, para quem
Lindbergh fez campanha desde julho. Em outras cidades estratégicas,
continuarão a disputar separados. Pezão de um lado, Lindbergh de outro,
em um cabo de guerra no qual o vencedor ganha credenciais para 2014.
O PT cresceu no estado e garantiu 10 prefeituras por enquanto.
Desde o começo das eleições, há 90 dias, Lindbergh passa os fins de
semana em campanha. “Acho que aproveitei muito bem essa eleição. Dei um
salto”, afirma o petista. Tanto Lindbergh como Pezão fizeram campanhas
com candidatos do PSB – alguns em cidades diferentes. Em Duque de
Caxias, por exemplo, Lindbergh mede forças com o PMDB. De um lado está
Alexandre Cardoso, do PSB, apoiado pelo petista, e, de outro, o
peemedebista Washington Reis. “Não tenho dúvida que minha relação com o
PSB é muito consolidada no estado do Rio. Acho que a tendência do PSB é
nos apoiar”, afirma Lindbergh. Para Pezão, o natural é que o PSB
permaneça em seu arco de alianças.
O ano de 2014 será o da Copa do Mundo. Um período que tanto poderá
gerar uma onda de otimismo favorável a um governo de continuidade como
acentuar problemas graves, como a falta de estrutura do aeroporto
Internacional Antônio Carlos Jobim. O vice-governador afirma que seus
cartões de visitas para as eleições, como coordenador executivo de
projetos e obras de infraestrutura, serão o arco metropolitano – uma
autoestrada construída no entorno da Região Metropolitana para
desafogar o trânsito – e a Linha 4 do metrô, que chegará à Barra da
Tijuca.
Pezão adianta que, se eleito, não concorrerá à reeleição. Caso
assuma em 2014 e tenha o apoio das urnas para ficar mais quatro anos
como governador, será impossibilitado de pleitear o mandato 2018- 2022.
A estratégia do PMDB abre espaço para Eduardo Paes tentar o governo do
estado daqui a seis anos. O plano peemedebista é ambicioso. Falta
combinar com os russos.
Fonte: Veja
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