Matéria sobre CAPS no JN repercute na cidade


Recebi em meu e-mail pessoal a mensagem abaixo enviada por Dr. Flávio Mussa Tavares acerca da comentada matéria que foi ao ar ontem no Jornal Nacional (clique aqui caso ainda não tenha visto) sobre o caos no CAPS III de nossa cidade. Independentemente de não ter votado na prefeita, considero importante que tenhamos conhecimento de outros argumentos, e sendo assim, publico as considerações de Dr. Flávio aqui no blog. 
De qualquer forma, como a maioria das pessoas, fiquei estarrecido com a reportagem e mais ainda com a entrevista do secretário de Saúde de nossa cidade, que vai esperar até segunda-feira para fazer algo. Não sou especialista no assunto, mas ainda acho que as condições mostradas não são as ideais. Muito longe disso. E com todo respeito que merece Dr. Flávio Mussa, amigo de minha família há muito tempo, não consigo, depois de ver a matéria 3 vezes, defender algo assim.
Por fim, o amigo Ricardo André, em seu espaço "Eu penso que..", relatou há pouco que o prefeito, digo, o marido da prefeita, deputado Anthony Garotinho foi para seu programa de rádio hoje dizer que a denúncia apresentada pela Rede Globo, é mais uma tentativa de chantagem, já que "esta semana teria denunciado privilégios das emissoras de televisão e rádio numa MP que está em tramitação no Congresso e que a matéria de ontem seria uma forma de tentar intimidá-lo."
Poupe-nos, deputado!!!!
Ah... o mesmo Garotinho ainda afirmou que a situação é "insustentável" e garantiu que a prefeita vai "punir os culpados". Um pouco contraditório, não é mesmo??
Abaixo, para reflexão e conhecimento de nossos leitores, o e-mail de Dr. Flávio Mussa:


"Sou médico do CAPS III. É para mim uma alegria lidar com a clientela sofrida que faz parte de nossa rotina. Os CAPS foram instituidos no Brasil em 2001, na chamada Reforma Psiquiátrica que extinguiu os manicômios.

Nossa clientela é a maioria oriunda desse sistema. São chamados clientes "institucionalizados", que pode ser traduzido como um paciente que não sabe viver sem a instituição.
O CAPS III Romeo Casarsa, que foi protagonista de uma matéria veiculada no Jornal Nacional de hoje foi inaugurado em 2009.
Temos mais de 300 pacientes, dos quais atendemos mais de 80 ao dia.
Nenhum de nossos pacientes é acamado. Aliás, uma regra da instituição psiquiátrica é que o paciente esteja com o nível de consciência alerta e podendo andar. Caso sua consciência esteja apagada ou não consiga andar, configura uma caso clínico e não psiquiátrico. Nosso paciente é vertical. O paciente clínico é horizontal.
Essa demanda é externa, isto é, não dorme na instituição.
Mas temos sempre cerca de 6 pacientes internados, que geralmente permanecem lá em períodos de crise que não ultrapassam 7 dias.
Essa clientela, que vivia em hospitais, vive hoje uma realidade que concordamos é pobre, mas não há indignidade. Nossa clientela recebe quatro refeições por dia (desjejum, almoço, lanche e janta),  tem atendimento médico, psicológico, terapia ocupacional, música, fazem bijuterias e tem até uma grife: "Loucas por Acessórios".
Essa clientela usa medicação sedativa. Eles passam o dia na instituição. Eles tem sono e deitam de dia.
Nós não temos leitos para 20 ou 30 pessoas que não estão propriamente "dormindo", mas sim descansando, tirando uma soneca de dia.
A forma como foram veiculadas as imagens sugerem que são pacientes internos que vivem amontoados ou que são acamados e estão sendo humilhados.
Reconheço que não temos o espaço físico adequado, entretanto, o que se viu foi uma hora de descanso em que muita gente deitou em colchonetes no mesmo horário. Detalhe: o horário é diurno!
Todos estes que estão ali repousando voltam para casa entre as 17 e 18 horas, após receber uma quentinha do jantar.
O clima ali só é agitado quando alguns pacientes apresentam crises de agitação ou agressividade. Nesses momentos, o corpo de enfermagem contém fisicamente até que seja feita a medicação tranquilizante.
Nunca vi ninguém ser humilhado, maltratado ou ignorado no Caps III.
Faria mesmo um desafio. Gostaria que os repórteres da Globo entrevistassem os nossos pacientes.
Seria uma forma sadia e madura de avaliar a instituição.
De qualquer forma, eu me sinto honrado em fazer parte do corpo técnico do CAPS III, que no meu entender é de primeira qualidade e supera as dificuldades materiais, supera as dificuldades de lidar com o paciente mais marginalizado de nossa sociedade e supera as dificuldades de lidar com a intriga, a calúnia e a ingratidão."


 
-- 
Flávio Mussa Tavares
Médico Psiquiatra

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