Esta é a realidade da África do Sul dois anos depois da Copa
Um trecho de uma interessante matéria do Portal IG sobre a situação da África do Sul, dois anos após a festejada Copa do Mundo no país:
A África do Sul é um país que padece em aparente tranquilidade. Do
alto e em áreas restritas, cidades como Johanesburgo parecem tão ricas
e seguras quanto algumas metrópoles europeias. Da janela do avião, na
aproximação para aterrissagem no aeroporto de OR Tambo, é possível
identificar um mosaico de condomínios que se estende até o horizonte,
onde casas de várias águas, com quintais amplos e piscinas, se
intercalam em ruas arborizadas. Shoppings centers oferecem grifes de
todas as partes do mundo. E tudo é interligado por largas avenidas.
É só eventualmente, em episódios como a morte de 34 mineiros pela polícia
, na mina de platina da Lonmin, em Marikana, que a ponta mais visível
da encruzilhada que vive a África do Sul atravessa essa redoma.
Encaminhada a questão racial, o país precisa encontrar um modelo de
desenvolvimento que reduza rapidamente o desemprego e o abismo que
separa ricos de pobres. Dois anos após a Copa do Mundo e a conclusão de
projetos bilionários, justificados pelos ganhos econômicos que deveriam
gerar no longo prazo, os sul-africanos estão diante dos mesmos
problemas de antes. Mas em clima político mais instável.
O modelo de desenvolvimento econômico atual tem funcionado pouco
para reduzir a pressão social. Encravada no extremo sul do continente e
afastada milhares de quilômetros de qualquer um dos grandes mercados
mundiais, após o fim dos embargos econômicos impostos nos tempos do
apartheid a África do Sul virou uma economia basicamente exportadora de
commodities minerais e agrícolas, como ouro, platina e açúcar.
Acordos
de livre comércio com os Estados Unidos e a Europa também ajudaram o
país a atrair grandes montadoras, que continuam a chegar e devem
produzir este ano no país cerca de 600 mil automóveis. Tudo somado, foi
suficiente para garantir crescimento médio de quase 4% ao ano do PIB –
que quase triplicou no período, para US$ 363,9 bilhões – e passaporte
para os Brics (sigla que originalmente identificava o grupo dos
principais países emergentes, formado por Brasil, Rússia, Índia e
China). Mas não para reduzir a pressão social deixada pelo regime
segregacionista em um país onde convivem mais de uma dezena de etnias.
A
África do Sul tem hoje um déficit de milhões de empregos e o
desaquecimento da economia mundial traz más perspectivas para o futuro,
como o governo admite. “O preço das commodities é muito volátil e não
permite um crescimento sustentável”, diz Lionel October, diretor-geral
do departamento de comércio e indústria do governo.
O índice de desemprego se encontra na casa dos 25% da população. Em
algumas áreas onde a concentração de pobres e negros é maior, como em
Soweto, centro nevrálgico da resistência ao apartheid, o percentual
chega a 48%. Pelo critério de desigualdade de renda (coeficiente Gini),
o país só perde para a Namíbia, em um ranking com 136 países no qual o
Brasil é o 16º.
Apesar de o desemprego ser mais
evidente entre a população negra, a redução da desigualdade social se
tornou uma questão que vai além da histórica divisão racial. Hoje,
milhares vivem em casas confortáveis, frequentam as mesmas escolas que
os brancos e desfilam sacolas em shoppings das grandes cidades. Em
cargos governamentais são maioria em diversos escalões. Mas faltam
empregos para milhares de outros.
Infraestrutura da Copa
Há
poucos anos, o anúncio de grandes projetos de infraestrutura para a
Copa e o evento em si geraram expectativa de mudanças. Além dos postos
de trabalho imediatos, a nova infraestrutura deveria fortalecer a
economia no longo prazo. Estradas foram de fato alargadas; há mais
opções de transporte coletivo, como corredores de ônibus e trens
urbanos, e os aeroportos agora são eficientes e têm capacidade de folga.
O
bairro de Soweto, em Johanesburgo, abriga cerca de 1,8 milhões dos 4,8
milhões de habitantes da cidade e tem 50% de desempregados.
Mas
nem tudo deu tão certo. Os estádios, que custaram bilhões e têm alto
custo de manutenção, estão subutilizados e o turismo não deslanchou
como poderia, principalmente por motivos externos. Segundo dados do
governo, depois de crescer 15,1% no ano da Copa, em 2011 a atividade
desacelerou e teve alta de 3%, para 8,3 milhões de visitantes
estrangeiros. “Neste ano, o movimento está voltando. Mas o ano passado
foi muito ruim”, afirma Alexei Harris, há nove anos guia de turismo na
Cidade do Cabo. “Em boa parte por causa da crise econômica na Europa”.
A
violência também atrapalha. De perto, os condomínios têm muros altos,
reforçados por arames farpados, e muitas ruas precisam ser patrulhadas
por seguranças privados. Na Long Street, centro da vida noturna na
cidade do Cabo, é possível identificá-los pelos coletes fosforescentes,
com a inscrição “Public Safety”. Alguns albergues e hotéis têm os
próprios seguranças 24horas na porta. Em Johanesburgo, apesar dos
esforços de revitalização da área central iniciados pelo governo local,
poucos se sentem confortáveis de sugerir a um turista que visite a área
sozinho.
Quem vive no país admite o problema, mas
costuma minimizá-lo alegando que é uma questão de saber por onde andar,
“como em qualquer lugar”. Mas as estatísticas sugerem precaução. A
África do Sul tem o maior índice de mortes por habitantes do mundo. São
17,3 para cada mil.
Durban,
na costa leste do país, banhada pelo Oceano Índico, é sede das
principais indústrias automobilísticas no país e do segundo maior porto
da África.
A
fama faz com que turistas de primeira viagem, assim como acontece com o
Brasil, se surpreendam quando não se sentem ameaçados. “Foi muito mais
tranquilo do que imaginávamos”, afirma a espanhola Ane Goitia, que na
terça-feira encerrou uma viagem de quase um mês por várias cidades do
país, na companhia da amiga Eider Goiburce.
A Copa
também não resolveu a precária infraestrutura de comunicação do país,
deficiente mesmo se comparada à do Brasil. Acessar a internet em hotéis
de luxo por uma hora pode custar na moeda local o equivalente a R$ 30.
E o preço salgado não garante velocidade nem estabilidade. Abrir um
vídeo no Youtube ou baixar arquivos são tarefas praticamente
impossíveis. Mesmo o acesso a sites de e-mail exige paciência.
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