CARTA DE UMA CAMPISTA POR ADOÇÃO‏

Reproduzido do blog do Fernando Leite:

Prezado campista,
Nosso povo já foi conhecido em todo o país por suas gloriosas lutas. Desde o tempo que se iniciou o relato sobre as pessoas que pisavam esta terra as histórias sempre retratam guerreiros nobres, pessoas com ideais, de caráter bem formado e sem medo.
Desde os índios, primeiros habitantes das terras Goytacazes, sempre se lutou com valentia e honra na defesa da terra; e dos frutos desta tão rica e sensível região. E em defesa de ideais como: liberdade, paz, honestidade e prosperidade.
Essa terra foi berço de Benta Pereira, nobre mulher viúva que não se dobrou ao poderio da classe dominante da época, tendo a coragem extrema de até pegar em armas para defender nossa terra. Saiu para a capital em busca de ajuda, tendo como local de encontro uma clareira, às margens do Rio Paraíba, hoje no local há uma praça, em homenagem às quatro viagens empreendidas pelo grupo, o nome da praça é Praça das Quatro Jornadas.
Também foi campista de Morro do Coco, o Advogado Nilo Peçanha, abolicionista mulato de cabelo crespo, e nariz abatatado, com origem humilde e grandes ideais. Foi ridicularizado, várias vezes por causa da cor de sua pele, odiado por alguns pela modernidade e radicalidade de suas lutas. Mas as adversidades e as zombarias não o impediram de lutar, de dar sua contribuição à história nacional, pondo sua marca própria: participou da campanha abolicionista e republicana. Mas ele ainda queria mais, e conseguiu: conquistou o mais alto cargo da política nacional: ele foi nosso sétimo Presidente da República.
Não vou me alongar citando outros nobres homens e mulheres que pisaram nesse solo, que beberam da água do Rio Paraíba aqui, nessas terras. E que, portanto foram contagiados pelo pulsante amor pela terra goitacá.
Eu por exemplo, apesar de humilde cidadã, fui acometida por essa forte paixão. Não nasci campista, mas me tornei campista. Talvez até muito mais do que alguns que aqui nasceram, já que não tiveram opção, nasceram e pronto. Eu não, escolhi viver aqui.
Eu nasci em Piraí, no sul do estado e vim para Campos ainda bebê com meus pais. Para concluir meus estudos mudei-me ainda jovem para o Rio de Janeiro. Após dezessete anos morando na capital eu me sentia um peixe fora d’água. Aquele não era meu espaço, meu lugar, eu não pertencia àquela paisagem.
Talvez faltasse o cheiro do vinhoto, o carvão das queimadas caindo nos meus cabelos, o vento nordeste a uivar nos prédios, o mar cor de café-com-leite. Sentia falta da conversa fácil dos “homens de negócio” que passavam à tarde no “cospe em pé”, comprando e vendendo coisas. Uma verdadeira bolsa de valores! Não sei direito, do que sentia falta, só sei que faltava CAMPOS! Até nosso caldo de cana é o mais saboroso do país, e olha que eu já experimentei vários, em vários lugares. Pois, como disse, estava procurando meu lugar, meu sabor, meu amor verdadeiro. Mas meu lugar é aqui, sou campista!
Então voltei para minha cidade, para minha terra, vim saciar minha sede de reencontrar esse povo aguerrido, assim como eu: forte, lutador, que pensa e se comporta como eu!
E o que eu encontrei? Um povo acomodado e comprado. Comprado por R$1,00 (um real)! A política do pão e do circo está institucionalizada aqui na minha doce e querida Campos. O pão custeado pelas benesses do governo com todas as “bolsas” existentes e possíveis (e até as incabíveis), para seus séquitos; e o circo, com shows para distrair e mascarar a falência cultural, política, econômica e social da cidade: Nosso centro histórico está em ruínas; o comércio falido vive das glórias do passado; as escolas sem professores, sem merenda, sem material; os postos de saúde e hospitais, sem médicos, sem remédios e sem vagas! As pessoas são atendidas nos corredores!
A todo o momento um escândalo novo aparece, “Nanongate”; “operação cinquentinha”; prefeita que é afastada, mas volta depois de uma gestação; as instituições sem os repasses; demissão em massa na construção civil por falta de pagamento da prefeitura; os buracos pintados das ruas de cor de rosa; antecipação de valores pagos a empreiteiros; obras paralisadas, superfaturadas. E a prefeita sobe no palco para CANTAR! E cadê o nosso povo? Está na platéia? Aplaudindo esse show de desrespeito?
Eu não estou incentivando uma revolta armada, quebra-quebra, invasão de prédios públicos, nem destruição de coisa alguma. Eu estou perguntando por qual motivo ainda não fomos para as ruas, de forma organizada e pacífica falar que exigimos respeito, lisura e planejamento na administração do orçamento bilionário da PMCG.
Com mais de R$ 2.000.000.000,00 (dois bilhões de reais), nossa cidade deveria ser exemplar em termos de ordem, conforto, limpeza, segurança, com trânsito organizado, as ruas bem iluminadas, além de vários outros serviços públicos que não se vê aqui. Que, aliás, serviços esses que são contratados e pagos, porém não executados a contento. Falta administração, governo!
Os servidores deveriam ser todos concursados, receberem salários dignos e todos os demais direitos trabalhistas, em dia; nossas ruas deveriam ser como tapetes, de tão bem cuidadas; nossas escolas, creches, hospitais e postos de saúde modelos para todo o país; temos dinheiro sobrando para tudo funcionar bem. E por que motivo tudo funciona tão mal? Falta administração, governo verdadeiramente voltado para o povo. E vamos fazer o que a respeito?
Voto é procuração! Se eu dou uma procuração para alguém comprar uma bicicleta, por exemplo, e a pessoa não faz a compra de acordo com as minhas expectativas, eu caço a procuração! Ora, a administração municipal está de acordo com as expectativas de quem? Do povo? Ou da própria administração? E a prefeita viaja, tira férias ou vai cantar! De oficial ela só canta!
Existe um dito popular que diz: “Quem canta, seus males espanta!”, meu avô materno dava seu “toque pessoal” e o ditado ficava assim: “Quem canta, seus males espanta e encanta!” E talvez ele tenha razão: Estamos como que num transe, enfeitiçados, encantados mesmo! E não tomamos nenhuma providência!
E falando em dito popular, eu gostaria de informar que se engana o campista que pensa que o ditado “Campista nem fiado nem a vista!”, refere-se à falta de credibilidade de nossa gente, muito pelo contrário! Esse ditado nasceu da recusa do povo campista em vender terras para Silvério dos Reis (o traidor de Tiradentes), que, segundo disseram, seriam compradas com o dinheiro recebido da coroa portuguesa em troca da delação. Os campistas não aceitaram a transação de forma alguma, nem com pagamento “fiado”, nem “a vista”. O povo campista daquela época não se vendia e o povo campista de agora?

Ana Paula Paiva

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