Cronicando no Sábado


Luminosa manhã

Walnize Carvalho

Naquele sábado, levantei-me cedo.
Ao invés de ficar sob os lençóis desfrutando de mais uma hora de sono - repito – levantei-me cedo.
Em mente, planos de ocupar o dia faxinando armários, arrumando gavetas, arquivando papéis.
O primeiro gesto matinal foi abrir janelas e portas para bendizer a luminosa manhã.
Lentamente, dirigi-me à cozinha a fim de preparar o café matinal.
Uma brisa suave corria pelos cômodos da casa. O sol, que já estava lá fora dando plantão, veio espalhar seu sorriso por entre as venezianas.
No rádio, em baixo volume, Chico Buarque derramava estes versos: ”Todo dia ela faz tudo sempre igual”. Por um instante peguei - os emprestado para mim e, com um sorriso irônico nos lábios,balbuciei: -Tudo sempre igual! - pensando na rotina das tarefas domésticas.
Imediatamente, me penitenciei do meu resmungo e passei a pensar em outros atos rotineiros: o da vizinha solitária que conversa com suas plantas; o do presidiário; o do enfermo na cama de um hospital ; o do trabalhador ao sol ...
Desliguei o rádio e antes mesmo de dar início aos afazeres que eu me propus executar, fui à janela. Debrucei-me no parapeito, distraída.
Absorvida em meus pensamentos fui despertada pelo canto insistente de um pássaro: - Bem-te-vi! - Bem-te-vi!!! Não reconhecendo, de imediato, de onde vinha tal “chamamento” caminhei ao encontro da ave madrugadora. Ave (diga-se de passagem) de rara beleza, que se caracteriza pela coloração amarela viva no ventre e uma listra branca no alto da cabeça, cujo canto já é o seu próprio nome. Li até certa vez ,que é um dos pássaros mais populares do Brasil, e um dos primeiros a vocalizarem ao amanhecer.
Segui à sua procura. Dirigi-me à porta da cozinha olhando em todas as direções: para o céu, para o muro alto que divide minha casa com a do vizinho, para as frestas do telhado, para os galhos da árvore no fundo do quintal e ... nada de encontrar o “visitante matinal”. E ele, como a brincar de pique-esconde, repetia: - Bem-te-vi! - Bem-te-vi!!! Até que retornando à janela, o avistei no poste da calçada do outro lado da rua.
Balancei a cabeça com sorriso novo nos lábios. A placidez veio me fazer companhia fazendo com que eu alçasse vôo em minhas reflexões: O pássaro chegou. Quebrou o ambiente silencioso com seu vigoroso canto. Como o esplendoroso sol. Como um amigo, que aparece de surpresa e ilumina nossa manhã.

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