Sobre o casamento
O escritor brasileiro Rubem Alves escreveu uma crônica muito inteligente, a respeito do tema casamento.
Eis suas palavras:
Depois de muito meditar sobre o assunto, concluí que os casamentos - relacionamentos - são de dois tipos: há os casamentos do tipo "tênis" e há os casamentos do tipo "frescobol".
Os casamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimentos, e terminam sempre mal. Os casamentos do tipo frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa.
Explico-me:
Para começar, uma afirmação de Nietzsche com a qual concordo inteiramente. Dizia ele:
"Ao pensar sobre a possibilidade do casamento, cada um deveria se fazer a seguinte pergunta: você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até sua velhice"?
Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar.
O tênis é um jogo feroz. O seu objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: o outro foi incapaz de devolver a bola.
Joga-se tênis para fazer o outro errar.
O bom jogador é aquele que tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, e é justamente para aí que ele vai dirigir sua "cortada", palavra muito sugestiva, que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar.
O prazer do tênis se encontra, portanto, justamente no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo.
Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.
O frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola. Só que, para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca.
Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la.
Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado.
Aqui, ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra, pois o que se deseja é que ninguém erre.
O que errou pede desculpas, o que provocou o erro se sente culpado. Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos...
Em relacionamentos inspirados na ideia do "frescobol", o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração.
Bola vai, bola vem - cresce o amor...
Ninguém ganha para que os dois ganhem. E se deseja então que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim...
* * *
Pensemos nisso. Reflitamos sobre nosso comportamento nos relacionamentos que abraçamos.
Juntos, num mesmo jogo, numa mesma existência.
O bom jogador será sempre aquele que conhece o companheiro e que, acima de tudo, deseja vê-lo feliz.
Redação do Momento Espírita com trecho da crônica
Tênis e frescobol, de Rubem Alves, retirada do
site recantodasletras.uol.com.br.
Em 16.08.2010.
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