Crônica de sábado


Frutas no asfalto

(Crônica escrita em Niterói em 2010)
Walnize Carvalho

Como uma flecha ligeira a curiosidade puxou-me pela saia e quando me dei conta já estava frente ao vendedor ambulante, que ao me ver esbaforida tentou acalmar-me: - Que foi, senhora? Foi assaltada? Está se sentindo bem?
- Não! Sim! Tentei disfarçar a surpresa olhando fixamente para as mercadorias arrumadas no tabuleiro. E como quem descobre água no deserto perguntei: - Estas frutas!... Esta daqui seria... Ele interrompeu-me e falou com jeito orgulhoso e desenvolto: - Só vendo frutas que pouca gente da cidade grande conhece: jambo, abiu, jabuticaba, carambola, cajá... – e, eu – banana-maçã! E ele: - Esta é raridade por aqui. As que mais se encontram são: banana-ouro e banana-prata. Mas como a banana-maçã é muito procurada pelos fregueses, já tenho até fornecedor: é um cidadão lá de Campos...
Comprei a penca e, enquanto era colocada no saco plástico, meus olhos descobriam outras raridades: goiaba, pinha (conhecida também por fruta-do-conde) e laranja sem casca apropriada para doce.
Atravessei a rua.
Entrei na praça em frente. Sentei-me no banco debaixo de uma árvore frondosa. Fechando os olhos deixei que o pensamento elaborasse uma enorme salada de frutas regada a chantilly da saudade.
Aos poucos em um recipiente imaginário fui adicionando os frutos que conheci e saboreei ao longo dos tempos: abricós da casa do vovô Antônio; vampiros (cachos de frutas douradas) do quintal de “seu” Jerônimo; pitangas colhidas nos arbustos da praia do Farol; manacascatas (assim pronunciavam, nós, crianças) que “seu” Zizo distribuía com os vizinhos; mangas carlota (esta com nome de saudosa tia); azeitonas (frutas roxinhas) que caíam do arvoredo em frente à casa de tia Lili, em Santo Amaro; ingás vindos do Açu; favos de jaca da chácara do “Velho Limão” (figura emblemática da Rua do Gás); romãs da casa de Marly; abacates, jenipapos, sapotis, cirigüelas, araçás, tamarindos...
Em meio à tanta excentricidade lembrei-me de colocar: pêras, maçãs, abacaxis, cajus, mamões, uvas, caquis, morangos, pois, afinal, são fáceis de encontrar e possuem sabores que perpetuam em nosso paladar.
Sei que muitas ficaram de fora – principalmente – as que viraram celebridades e perderam o seu sabor original (sabem de quais estou falando, não é?).
Falar nelas... recordo-me de um galanteio dos mais antigos feitos a uma mulher bonita: - Ela é uma uva!
Paro por aqui antes que a crônica se torne uma salada de palavras difícil de ser saboreada.

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