Negócio da China- Zuenir Ventura
O mundo esportivo está surpreso com o desempenho dos atletas
chineses, que disputam com os americanos a liderança das Olimpíadas de
Londres. São mais de 60 medalhas até agora, das quais cerca da metade
de ouro. Qual o segredo do rápido sucesso de um país que em 1992, em
Barcelona, conquistara apenas 16 delas, mas já em 2008 pulara para 51,
superando os EUA? Wu Minxia e He Zi, que no domingo arrasaram no salto
ornamental em trampolim de três metros, podem exemplificar o fenômeno.
Durante um ano, a BBC de Londres acompanhou a preparação das duas e
chegou à conclusão de que elas foram submetidas a um regime de trabalho
forçado, ou quase. Junto com outros colegas, elas foram confinadas num
ginásio, tendo livre apenas uma tarde de domingo por semana. Do centro
de treinamento para os dormitórios, iam de ônibus e, no percurso, o
mundo exterior era apenas vislumbrado pela janela. Nos apartamentos,
que dividiam com outras, nada de visitas de fora. As refeições eram
feitas em conjunto numa cantina comunal. "A vida dos atletas consiste
em três coisas: treinar, comer e dormir", observa um funcionário do
local. He Zi, de 20 anos, e Wu Minxia, de 26, não têm namorados. "Eu
coloco todo meu coração e a concentração no treinamento. Não penso em
muitas coisas além disso", afirma He.
Quase ao mesmo tempo, o jornal britânico "Daily Mail" publicou fotos da preparação esportiva de crianças chinesas, perguntando se não constituíam de fato tortura os castigos físicos a que são submetidos meninos e meninas de 7 ou 8 anos de idade. As imagens são impressionantes. Em uma delas, uma garota de bruços, com os braços abertos, a cabeça levantada, chora de dor. Atrás, a instrutora segura uma espécie de palmatória. Em outra foto, um pé do treinador pisa forte a perna de uma menina deitada no chão, o rosto contraído, a boca aberta num grito que lembra o quadro de Edvard Munch. É chamado de "fábrica de atletas" esse processo capaz de criar fenômenos olímpicos como o de outra jovem, a nadadora Ye Shiwen, de 16 anos, que conquistou duas medalhas de ouro num tempo tão extraordinário que levantou a suspeita de doping. Parece que não era. É apenas mais um exemplo do "milagre" do sistema, impiedoso e desumano. Prefiro o nosso, mesmo precário e sem conseguir tantas medalhas. Se o governo chinês castiga assim seus atletas infantis, a pretexto de transformá-los em heróis olímpicos, o que não faz com os dissidentes políticos?
Quase ao mesmo tempo, o jornal britânico "Daily Mail" publicou fotos da preparação esportiva de crianças chinesas, perguntando se não constituíam de fato tortura os castigos físicos a que são submetidos meninos e meninas de 7 ou 8 anos de idade. As imagens são impressionantes. Em uma delas, uma garota de bruços, com os braços abertos, a cabeça levantada, chora de dor. Atrás, a instrutora segura uma espécie de palmatória. Em outra foto, um pé do treinador pisa forte a perna de uma menina deitada no chão, o rosto contraído, a boca aberta num grito que lembra o quadro de Edvard Munch. É chamado de "fábrica de atletas" esse processo capaz de criar fenômenos olímpicos como o de outra jovem, a nadadora Ye Shiwen, de 16 anos, que conquistou duas medalhas de ouro num tempo tão extraordinário que levantou a suspeita de doping. Parece que não era. É apenas mais um exemplo do "milagre" do sistema, impiedoso e desumano. Prefiro o nosso, mesmo precário e sem conseguir tantas medalhas. Se o governo chinês castiga assim seus atletas infantis, a pretexto de transformá-los em heróis olímpicos, o que não faz com os dissidentes políticos?
Se
o governo chinês castiga assim seus atletas infantis, a pretexto de
transformá-los em heróis olímpicos, o que não faz com os dissidentes
políticos?
Publicado no O Globo de hoje.
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